segunda-feira, fevereiro 18, 2013
Olhei em frente e enchi os pulmões de ar. Repeti o movimento de inspirar fundo e jogar tudo fora. Podia ser que saísse alguma coisa mais. Não saiu. Infelizmente por mais que uma pessoa inspire e expire, o que nos corrói fica agarrado ás paredes dos pulmões como se não houvesse amanhã. Resolvi então acender um cigarro. Se não morres pela saúde, que seja pela pior das vontades. Tirei um destes soldados brancos do maço e encostei-o ao canto da boca. Cheguei aos bolsos das calças e tirei o isqueiro. Inclinei a cabeça, cerrei um dos olhos e juntei as mãos em torno do isqueiro, não fosse a vida querer pregar-lhe uma partida. Assim protegido fi-lo funcionar. À terceira tentativa lá consegui ver a chama. Assim protegida pelas minhas mãos, inclinei a cabeça, cerrei um dos olhos e aproximei-a do meu soldadinho, qual cowboy na sua pradaria de veludo… Acendi-o e puxei por ele. Assim fechei o segundo olho enquanto olhava em torno do meu interior. Cá fora o ar matinal fazia-se duro de integrar, mas quem inspirou por ele tantas vezes não se deixa intimidar. Sobretudo que agora tenho a companhia do meu soldado incandescente. Assim com os olhos fechados, sonhava com a minha pradaria de veludo, com o sol a aquecer-me o coração. Foi de pouca dura a pradaria mas bastam uns segundos para conseguirmos estar noutro lugar. Quando fechamos os olhos, a realidade deixa de ser o nosso porto de abrigo. E é então que a vida corre-nos de feição. O mundo cruza o azul do céu com o calor da nossa alma. E bastam para isso poucos décimos de segundo. É bom. Pode acontecer em qualquer lado. Pode ser entre duas linhas de leitura, um parágrafo de escrita. Meio minuto e já lá estamos. Numa praia da América do sul ou num deserto africano. Num, campo sem fim á vista ou no dorso de um cavalo a cavalgar por um caminho sinuoso… Abri os olhos e voltei á terra. À minha volta tudo parecia tão denso, insensível e implacável. Tudo era de cinza e duro e áspero. Cortante. Afiado. De tremer por dentro. Mas eu não. Não tremo nem vacilo. Estou cá para as curvas. Eu e o meu soldadinho no canto da boca. Eu e o meu esgar noutra realidade. Eu e a minha pradaria de veludo. Sei que não é aquele o meu mundo. É apenas uma fantasia. Mas a verdade é que, de olhos abertos, chego muitas vezes à conclusão que este também não é o meu mundo. Este lugar não me aquece nem me arrefece. Não me traz brilho nem me faz vibrar. Mas também não me assusta. Estamos cá para as curvas o meu soldadinho e eu. Venha quem vier. Qualquer coisa e fecho os olhos…